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quinta-feira, 17 de maio de 2012

UNESCO quer mandar parar obras da barragem do Tua


Parar imediatamente as obras de construção da barragem de Foz Tua, solicitar uma missão conjunta de análise à situação da área de paisagem classificada do Alto Douro Vinhateiro como Património Mundial e remeter um relatório actualizado até ao final de Janeiro próximo. 

Estas são as principais exigências que o Comité do Património Mundial da UNESCO se prepara para adoptar na sua reunião de Junho, relativamente ao caso da construção da barragem da EDP na foz deste afluente do rio Douro. 

O projecto de decisão, a que o PÚBLICO teve acesso, está já concluído e, além daquelas exigências, é também colocado em causa o comportamento das autoridades portuguesas ao longo de todo o processo. Apesar de redigido, como é norma, num tom diplomático, o documento não deixa referir uma postura que pode ser classificado como de certa deslealdade por parte dos responsáveis portugueses, que não prestaram qualquer informação sobre os projectos para a construção de barragens e autorizaram o arranque das obras numa altura em que a missão de análise acabava de visitar o local e não tinha ainda sequer iniciado o seu relatório. 

Quanto à parte decisória, com dez pontos, não deixa margem para dúvidas ao "instar o Estado [português] a parar imediatamente todos os trabalhos de construção da barragem de Foz Tua e toda a infra-estrutura associada". É igualmente exigido que seja solicitada a realização de uma "missão conjunta de monotorização para estudo do impacto potencial" das alterações ao projecto que foram, entretanto, anunciadas pela EDP. E ainda que o Estado português "remeta ao Comité do Património Mundial um relatório sobre a revisão ou o reexame do projecto" e também "sobre o estado de conservação" da área classificada, para que seja analisado pelo comité na sua reunião anual de 2013.
O projecto de decisão será analisado no encontro deste ano, que decorre a partir de 24 de Junho na cidade de S. Petersburgo, na Rússia. Em regra, todas as propostas são aprovadas, havendo apenas registo de pequenas alterações ou arranjos resultantes do trabalho diplomático que antecede este tipo e encontros. 

Como foi noticiado pelo PÚBLICO em Dezembro último, um relatório de avaliação resultante de uma visita realizada ao Douro, no início de Abril do ano passado, considerava que a construção da barragem de Foz Tua tem um "impacto irreversível e ameaça os valores" que estiveram na base da classificação do Alto Douro Vinhateiro como Património Mundial. Apesar de ter sido entregue às autoridades portuguesas ainda em Agosto, foi mantido em segredo até à divulgação da notícia e a resposta oficial do Governo àquele comité da UNESCO só terá chegado a 8 de Fevereiro deste ano, conforme se constata agora do projecto de decisão. No confronto de datas, o documento realça que "o projecto da barragem - embora previsto no Plano Energético Nacional de 1989 e no Plano de Bacia Hidrográfica do Douro de 1999 - nunca foi mencionado no dossier de candidatura". Refere-se ainda que em 2008 o Instituto da Água lançou o concurso público para a concessão da barragem. Este seria aprovado em 2010 e "o Estado [português] só informou o Centro do Património Mundial quando para tal foi solicitado". O projecto de decisão frisa também que o estudo de impacto ambiental "não inclui qualquer avaliação do impacto sobre o valor universal excepcional da paisagem classificada". 

Quanto à resposta dada pelo Estado português, foi argumentado que o projecto foi objecto de consulta pública e que as obra só poderiam avançar depois de uma avaliação favorável, ou com condições, de impacto ambiental, documento cuja data limite de publicação era 12 de Abril de 2010. "No entanto, a 11 de Maio de 2009, o projecto já tinha recebido uma aprovação ambiental, sob certas condições", frisa o comité da UNESCO. Outro dos argumentos avançados pelo Governo foi o de que, sendo o Alto Douro Vinhateiro considerado como "uma paisagem cultural evolutiva". há toda a conveniência em assegurar "a vida e a evolução". 

Em Dezembro, quando o PÚBLICO deu conta do relatório e da consequente ameaça para a classificação da UNESCO, o secretário de Estado da Cultura disse que o Governo admitia rever o processo. "Tem de ser uma decisão muito ponderada e assumida em bloco, e o Governo pondera analisar e avaliar toda a situação", disse então Francisco José Viegas.

 fonte: Público

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Tentativa de venda de comboio histórico da CP suscita escândalo e boicote na Europa

Federação Europeia de Caminhos-de-Ferro Turísticos apelou a museus para não comprarem comboio de via estreita estacionado na Régua, em nome da defesa do património português.

CP tentou vender junto de museus ferroviários europeus o comboio histórico de via estreita estacionado na Régua, mas a Federação Europeia das Associações de Caminhos-de-Ferro Turísticos (Fedecrail) boicotou essa tentativa, pedindo aos museus que renunciassem à compra, mesmo que estivessem interessados.

"Essa proposta pareceu-nos escandalosa, porque o material em via métrica português é raro e é uma composição que está em bom estado", disse ao PÚBLICO Jacques Daffis, vice-presidente da Fedecrail, que tomou a iniciativa de informar o Museu Nacional Ferroviário português, que desconhecia esta tentativa de venda por parte da CP. "O que é incrível é que a CP tenha proposto a sua venda sem informar previamente o museu português", disse, explicando que a posição da Fedecrail é de que o património deste tipo só deve ser vendido ao estrangeiro "se não houver nenhuma possibilidade de preservação no país de origem e/ou se estiver em perigo".

A tentativa de venda partiu da CP Frota, a unidade de negócios que gere o material circulante, através de um email muito informal, datado de 9 de Novembro e enviado para museus ferroviários europeus, no qual até se propunha que fossem estes a avançar com uma proposta de preço.

Contactada a CP, a porta-voz da empresa explicou que se trata de um comboio que está em condições operacionais (em 2005 ainda circulou na Linha do Corgo), mas que não tem agora utilização possível em Portugal, com o fim anunciado da Linha do Vouga, que é a última linha de via estreita em funcionamento no país. "Podendo haver interesse por alguma companhia ferroviária na sua colocação ao serviço para fins turísticos, a CP fez uma primeira auscultação do mercado para verificar a existência de eventuais interessados", disse a mesma fonte. A CP mantém, por isso, o interesse na venda, mas admite agora que "será dada preferência ao Museu Nacional Ferroviário, caso este tenha disponibilidade" para o comprar.

Esta posição oficial da CP surpreendeu o presidente da Fundação do Museu Nacional Ferroviário, Júlio Arroja, que tinha pedido à CP para que houvesse uma "cedência" (e não uma venda) daquele material circulante ao museu. "Foi feito um pedido à administração da CP e creio que o assunto está bem encaminhado", disse ao PÚBLICO.

É que, embora tenha sede no Entroncamento, o Museu Nacional Ferroviário tem secções museológicas em todo o país e existe precisamente um projecto para Macinhata do Vouga (Águeda). Este projecto consiste na requalificação do complexo ferroviária daquela estação, para albergar ali o comboio histórico e poder vir a dar-lhe utilização, com passeios turísticos entre Aveiro, Águeda e Sernada do Vouga. Um projecto que agora fica no limbo, com o encerramento da Linha do Vouga.

Material do início do séc. XX
O comboio histórico de via estreita em causa é composto por uma locomotiva a vapor fabricada na Alemanha em 1923 e enviada para Portugal a título de indemnização da I Grande Guerra. Esta máquina prestou serviço em praticamente todas as linhas de via estreita do país e está ainda operacional. A composição pode também ser rebocada por uma locomotiva a diesel de 1964, fabricada em Espanha, e comprada pela CP em segunda mão nos anos setenta.

Além de um furgão em madeira de 1925 e de um vagão-cisterna, a composição inclui uma carruagem de origem belga de 1908, outra fabricada na Alemanha em 1925 e ainda uma outra construída pelos então Caminhos de Ferro do Estado, nas oficinas do Porto, em 1913. O conjunto constitui um acervo único em Portugal e raro na Europa, que deve ser preservado, "de preferência no país de origem", refere Jacques Daffis.

Comboios turísticos
Apesar de residual em Portugal, a exploração de comboios turísticos e dos museus ferroviários a que estes estão associados constituem uma actividade que só em três países europeus – Alemanha, Reino Unido e França – emprega 3812 pessoas e factura anualmente 174 milhões de euros.A Fedecrail – Federação Europeia dos Caminhos-de-Ferro Turísticos e Históricos é um organização de direito belga que congrega 616 membros de 27 países e que tem por missão a coordenação de todos os caminhos-de-ferro históricos e dos museus que se ocupam da sua conservação, bem como da protecção do material circulante que lhes está associado.

Em Portugal, o único comboio histórico em funcionamento é o do Douro, entre a Régua e o Pinhão, que só circula no período de Verão. A CP ameaça acabar com ele, se não aparecer qualquer entidade disposta a assumir-se como parceira de exploração do comboio que este ano registou prejuízos da ordem dos 60 mil euros. A CP já teve também o Comboio do Vinho do Porto, que circulou no Douro, mas que se encontra agora semi-abandonado em Contumil.

Fonte: Público